TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO/HIPERATIVIDADE (TDAH)
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Tania Zagury Filósofa, Mestre em Educação e Escritora
Distúrbio que vem crescentemente preocupando pais e professores nas últimas décadas, o Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) tem recebido diferentes denominações a partir, principalmente, de 1902: Disfunção Cerebral Mínima, Reação Hipercinética da Infância, Distúrbio de Déficit de Atenção, até a atual nomenclatura, utilizada no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, da Associação Americana de Psiquiatria. O TDAH costuma aparecer bem cedo, ainda na primeira infância, em geral antes dos 7 anos. É um distúrbio crônico, e, para efeito de diagnóstico, as características que serão em seguida apresentadas precisam ser constantes na vida, e não aparecer como comportamentos ocasionais. Observações com esse propósito, portanto, devem ser feitas por um período nunca inferior a 6 meses, indo a até um ano aproximadamente. Outro dado importante para efeito de diagnóstico é que o distúrbio revela-se independentemente do ambiente onde a criança esteja, assim como também não depende do tipo de tarefa. Não é um problema de inteligência, como muitos pensam, mas, sim, de execução. Explicando melhor: a criança pode até saber o que deve ser feito, mas parece não conseguir concretizar o objetivo ou pensar antes de agir.
Ainda não se sabe ao certo o que causa o problema, mas estudos recentes apontam para: | |
Hereditariedade (cinco vezes maior em quem tem pais com o transtorno).
Problemas durante a gravidez ou no parto.
Sofrimento fetal no nascimento.
Exposição a substâncias como chumbo e fumo, entre outras.
Problemas familiares (discórdia conjugal).
Baixa instrução paterna.
Funcionamento relacional caótico na família.
Presença de apenas um dos genitores.
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A prevalência é de 3% a 6% em crianças entre 7 e 14 anos, com freqüência um pouco maior nas meninas. Na adolescência, são poucos os dados disponíveis. É freqüente a comorbidade, ou seja, em geral o problema se apresenta em conjunto com outros. Cerca de 50% das pessoas afetadas costumam apresentar também problemas de comportamento, como agressividade, tendência a mentir, roubo, oposição, desafio a regras. Estudos recentes comprovam que 70% das crianças com TDAH mantêm o diagnóstico aos 14 anos, e algumas, por toda a vida. De acordo com o desenvolvimento, os sintomas apresentam diferentes predominâncias. Nos pré-escolares, revelam-se mais como hiperatividade, dificuldades em aceitar limites e tolerar frustrações; na idade escolar, em geral apresenta sintomas combinados, enquanto, na adolescência, tende mais para a impulsividade e desatenção. Os manuais de psiquiatria apresentam comumente quatro variantes ou tipos: desatento, hiperativo-impulsivo, combinado e não-específico.
A seguir, listamos os sintomas mais freqüentes em cada um dos quatro tipos. Conhecê-los é essencial para o diagnóstico e tratamento eficazes: |
1) Desatento
Não presta atenção a detalhes ou comete enganos por descuido.
Tem dificuldade de concentração em tarefas e/ou jogos.
Tem dificuldade de seguir instruções e/ou terminar tarefas.
É desorganizado nas tarefas e com os materiais.
Evita atividades que exijam esforço mental continuado.
Perde objetos necessários às atividades.
Distrai-se com facilidade.
Esquece tarefas e compromissos diários.
Parece não ouvir.
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2) Hiperativo-impulsivo
Inquieto (remexe pés e mãos quando sentado).
Não pára sentado muito tempo.
Pula, corre muito sem destino (“bicho-carpinteiro”). No adulto, manifesta-se por um sentimento geral de inquietação.
É muito barulhento.
É muito agitado.
Fala excessivamente.
Responde antes de se terminar de perguntar.
Tem dificuldade de esperar sua vez.
Intromete-se em conversas e jogos alheios.
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3) Combinado
Apresenta sintomas de ambos os conjuntos de critérios
(parece estar associado a maiores prejuízos globais na vida da criança).
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4) Não-específico
Características em número insuficiente para um diagnóstico completo.
Ainda assim, pode desequilibrar a rotina diária.
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O diagnóstico do TDAH é complexo e delicado. É necessário considerar as múltiplas facetas do ser humano: intelectual, acadêmica, social e emocional. Outros problemas podem ter sintomas similares como, por exemplo, depressão, delinqüência e impulsividade. No intuito de evitar enganos — bastante freqüentes, aliás —, é fundamental considerar como mais importante o histórico clínico e do desenvolvimento. O exame médico é essencial ao diagnóstico diferencial. Também é imprescindível conjugar dados fornecidos pelos diversos adultos que convivem com a criança (professores, pais, parentes, amigos). A presença de, no mínimo, seis sintomas, de forma contínua, nunca ocasional, e pelo menos em dois ambientes diferentes freqüentados pela criança (escola e casa, por exemplo) permite evitar muitos problemas, porque elimina ou minimiza a rotulação inadvertida ou precipitada. De qualquer forma, o médico ou o psicólogo são os profissionais habilitados a fechar o diagnóstico, enquanto a ação de pais e professores deve se ater à observação sistemática e ao extremamente útil fornecimento de dados concretos àqueles profissionais. Como já dissemos, a observação deve ser feita por um período de, no mínimo, seis meses consecutivos. Fica o alerta, porém, de que a diferenciação é difícil e deve ser sempre cautelosa; confunde-se bastante, atualmente, a criança ativa, saudavelmente ativa, com a portadora do TDAH. Com relação ao tratamento, o grande progresso é o reconhecimento da necessidade da intervenção precoce, bem como a consciência de que, para o êxito, são necessárias intervenções múltiplas. Em outras palavras: tendo sido feito o diagnóstico, o tratamento deverá ser feito por uma equipe composta de vários profissionais e deve priorizar inicialmente o esclarecimento da família e dos docentes. O importante é que sejam feitas correções de conceitos e “rótulos”; quer dizer, é preciso que a família e os professores tenham consciência de que o problema é real, não se tratando de preguiça, falta de força de vontade ou de inteligência. Outro aspecto importante é que, através dos encontros e da troca de informações entre os diversos profissionais envolvidos no tratamento, os pais liberam suas dúvidas e angústias, tornando-se mais aptos a colaborar de forma proativa. Algumas atitudes são fundamentais e devem ser praticadas por pais e professores como ferramentas essenciais ao tratamento do transtorno.
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Orientação para pais |
Estabeleça Prioridades.
Relacione as dificuldades e as hierarquize.
Ataque, primeiro a maior dificuldade.
Só depois de vencida a primeira, passe à outra.
Pense antes de agir.
Não tome atitudes de forma precipitada.
Relacione as alternativas de manejo.
Pense em cada uma delas e decida como agir.
Use o reforço positivo (recompensa) antes e preferencialmente à punição.
Ressalte os progressos e evite críticas constantes.
Tenha constância — os resultados só aparecem a médio e longo prazos.
Adote as mesmas atitudes em todos os ambientes que a criança freqüenta.
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Todos os adultos que convivem com a criança devem procurar agir da mesma forma.
Comunique-se com clareza e de forma eficiente, isto é, dê instruções claras.
As ordens, as instruções e os pedidos devem ser feitos um a um.
Deixe os limites claramente definidos.
Propicie atividade física regular.
Prefira atividades que tenham regras e limites.
Escolha criteriosamente a escola, dando preferência àquelas que disponibilizam trabalhos específicos para crianças com TDAH.
Lembre-se de que o trabalho em equipe (pais/família/profissionais) é o que traz os melhores resultados.
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Orientação para professores |
Converse com a criança para saber de que forma ela sente que aprende melhor.
Alterne estratégias e recursos até ter certeza do estilo de aprendizagem do aluno.
Comece com atividades simples.
Encoraje-a com freqüência.
Coloque-a perto de você, na sala de aula.
A cada semana, converse, privadamente, com a criança, informando-a sobre como ela está se saindo.
Use sempre a agenda para comunicar-se com os pais e outros profissionais que lidam com a criança.
Assinale e elogie os progressos, por menores que sejam.
Prepare a criança para cada nova situação, pois ela é sensível e se assusta com facilidade.
Deixe as regras de funcionamento da classe em local bem visível.
As regras devem ser curtas e claras.
Sempre que puder, utilize jogos como forma de operacionalizar tarefas e objetivos.
Quando a motivação é maior, a concentração aumenta.
Reduza os testes cronometrados, que reforçam a impulsividade e ansiedade.
Avalie qualitativamente.
Essencial é que aprendam.
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Abaixo, reproduzo um modelo de ficha, chamada SNAP-IV, construída a partir dos sintomas do Manual e Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – IV Edição (DSM-IV) da Associação Americana de Psiquiatria. O modelo pode ser usado para avaliar crianças e adolescentes. Sua tradução foi feita pelo Grupo de Estudos do Déficit de Atenção (Geda) da UFRJ e pelo Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência da UFRGS. Importante: Lembre-se de que o diagnóstico definitivo só pode ser fornecido por um profissional.
FICHA DE ACOMPANHAMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES Para cada item, escolha a coluna que melhor descreve o aluno. Marque um X: |
| Nem um Pouco | Só um pouco | Bastante |
1. Não consegue prestar muita atenção a detalhes ou comete erros por descuido nos trabalhos da escola ou nas tarefas. | | | |
2. Tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou atividades de lazer. | | | |
3. Parece não estar ouvindo quando se fala diretamente com ele(a). | | | |
4. Não segue instruções até o fim e não termina deveres de escola, tarefas ou obrigações. | | | |
5. Tem dificuldade para organizar tarefas e atividades. | | | |
6. Evita, não gosta ou se envolve contra a vontade em tarefas que exigem esforço mental prolongado. | | | |
7. Perde coisas necessárias para atividades (por exemplo: brinquedos, deveres da escola, lápis ou livros). | | | |
8. Distrai-se com estímulos externos. | | | |
9. Mostra-se esquecido(a) em atividades do dia-a-dia. | | | |
10. Mexe com as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira. | | | |
11. Sai do lugar na sala de aula ou em outras situações em que se espera que fique sentado. | | | |
12. Corre de um lado para outro ou sobe demais nas coisas, em situações em que isso é inapropriado. | | | |
13. Tem dificuldade em brincar ou envolver-se em atividades de lazer de forma calma. | | | |
14. Não pára ou freqüentemente está a “mil por hora”. | | | |
15. Fala em excesso. | | | |
16. Responde às perguntas de forma precipitada antes delas terem sido terminadas. | | | |
17. Tem dificuldade de esperar sua vez. | | | |
18. Interrompe os outros ou se intromete (por exemplo: mete-se em conversas/jogos). | | | |
Como avaliar:
1) Se existem pelo menos seis itens marcados como bastante oudemais de 1 a 9, existem mais sintomas de desatenção que o esperado numa criança ou num adolescente.
2) Se existem pelo menos seis itens marcados como bastante oudemais de 10 a 18, existem mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que o esperado numa criança ou num adolescente.
O questionário SNAP-IV é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (Critério A) para se fazer o diagnóstico. Existem outros critérios que também são necessários. | Importante: Não se pode fazer o diagnóstico de TDAH apenas com o Critério A! Use também os demais critérios, abaixo relacionados.
Critério A: Sintomas (vistos acima). Critério B: Alguns desses sintomas devem estar presentes antes dos sete anos de idade. Critério C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos dois contextos diferentes (por exemplo: na escola, no trabalho, na vida social e em casa). Critério D: Há problemas evidentes na vida escolar, social ou familiar por conta dos sintomas. Critério E: Se existe um outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose, etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente ao TDAH. |
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